terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Uma mistura inacabada


A igreja. A ponte. A praça. A rua. A casa. Nessa exata seqüência. A saudade dividindo meu peito entre o que fui e o que sou. Frases vagas e confusas demais para qualquer leitor. Mas nenhum sentimento é simples, nem pode ser simplificado.
Estrela do sul. Um buraco? Não. É o melhor lugar que existe. Estou de volta, ainda que por pouco tempo. Duas curtas semanas, divididas entre a mala pesada de livros que veio comigo e a vontade de rever tudo, principalmente as pessoas. Onde estão os meus amigos do meu tempo de perfeitinho? Nenhum deles joga vídeo game como naquele tempo. Eu também não. Mas sinto saudades
Há um pedaço de mim em cada uma dessas esquinas desertas. A verdade é que há um pedaço de cada uma dessas esquinas dentro de mim, pois as pessoas não se destroem deixando pedaços soltos por ai. As pessoas se constroem roubando pedaços do mundo.
Não me escondo mais atrás dos meus livros como eu fazia para esconder meu medo de ser quem eu era (Quem eu sou), apesar de estar atrás deles por necessidade. Quem eu sou? Alguém que pouca gente conhece. Uma mistura tosca de Apolo e Dionísio. Aquele que, às vezes, faz caretas tentando forçar um sorriso, que aprendeu com dificuldade a dizer o que sente e o que não sente, que se esconde no quarto para fazer músicas e depois mostra para as poucas pessoas em quem confia. Eu sou aquele que sempre derrama refrigerante sobre a mesa, que dificilmente diz palavras de afeto, ou as diz antes do momento certo. Sou aquele que quer ser livre, mas precisa de carinho... Que come uma pizza inteira sozinho no sábado à noite, mesmo sabendo que o vazio interior não fica no estômago... Que fica rindo sozinho no meio da aula e se atrapalha quando um professor menciona o nome “Manoel”... Que nunca sabe responder às perguntas, mesmo as mais simples, sendo fitado pelos quase cem pares de olhos.
Meus amores foram quase todos platônicos e incluíram personagens de livros, professoras excêntricas e meninas com auto-estima elevada. Meus relacionamentos, quase sempre meteóricos, vão da paixão à amizade mais rápido do que posso contar de um a dez.
Minha voz, que não é boa, agora tem tom aceitável e não tenho mais vergonha de desafinar.
Ainda moro em um mundo particular. Ainda tenho os mesmos sonhos. Ainda fico olhando estrelas à noite.
Eu sou a mistura inacabada dos pedaços do mundo que conheci. Há muito o que conhecer e muitos pedaços a serem encontrados.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O relógio da mão invisível

Na última quinta feira, no curso de inglês, me encontrei diante de uma reflexão profunda. 25 de novembro é o dia em que, nos EUA, as pessoas se reunem para agradecer pelas graças recebidas ao longo do ano. Junto a um pedaço de torta de abóbora recebemos um papel em branco para que escrevessemos sobre o que estávamos agradecidos. Pensei em minha vida e nas coisas que aconteceram nos últimos mêses. Nada escepcionalmente bom... Nada que preenchesse com ânimo aquele pedaço de papel.
É impossível não sentir o peso desta grande mão que nos acolhe diariamente com seu calor. Os caminhos tortos que sempre fazem nossas vidas mais felizes, mais humanas. A verdade é que minha vida está completamente diferente do que eu sonhei por muito tempo, mas isso não é ruim. Encontrei grandes amigos, descobri um sentimento bonito e me preparei moralmente para o peso dos meus sonhos. Quetionei minha vontade e meus motivos. Moldei minha personalidade para os dias que me esperam. Por que eles ainda me esperam em algum lugar no meu futuro. Eu não sei quando, nem saberia imaginar. Pergunte para a mão invisível! Ah... ela não tem email, telefone, twiter... Nada parecido. Nunca responde com palavras os recados que lhe enviamos. As respostas são melhores e mais sinceras que qualquer palavra pode ser. O grande problema é que nem sempre compreendemos isso. Nos revoltamos sem perceber que a palavra sim tem um gosto muito mais doce quando seguida da palavra não dita muitas vezes. É como o sol que aparece no fim da tarde depois de um dia inteiro de chuva. Tão grande e tão belo como sempre foi, mas se faz notável porque foi esperado.
Não vou me esquecer das madrugadas de estudos, nem do gosto do café que eu tomava para distrair o sono das aulas repetidas. Não vou me esquecer das longas piscadelas e dos sonhos repentinos. Não vou me esquecer das piadas sem graça, das conversas inúteis e tempo útil que se ganha com elas. Não vou me esquecer dos poucos amigos que fiz, ainda que eu nunca mais os veja. Nem das pessoas com quem eu nunca conversei, mesmo estando todos os dias na mesma sala e compartilhando o mesmo sonho. Tudo isso, leitor raro (que deve ser algum dos meus familiares, um amigo próximo, um desconhecido ou eu mesmo) vai ficar guardado junto com tudo o que vivi nesta minha curta e longa vida. Há um espaço ao lado do beijo na ladeira, atrás da guerra de barro, entre o mergulho no córrego, o gosto das jabuticabas e os natais em família. Não importa... Só sei que vai passar... O medo, a insegurança... Só as coisas boas duram mais que um minuto. Quanto tempo é um minuto? Eu não sei. Só a mão invisível sabe e eu não quero perguntar a ela, pois tenho medo que um minuto seja muito tempo.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Entre o imoral e o amoral

Há mais ou menos uma semana presenciei o conflito permanente, mas velado, dos dois mundos que dividem nossa sociedade.
_Passa a grana playboy! Foi a voz que ouvi. Um grito que me fez acordar do meu mundo cor de rosa. Um grito que furou a bolha na qual eu me prendia para não perceber a realidade. Por que a realidade é fria e desumana. A realidade é perversa e desleal. Essa é a realidade.
_Passa a grana, rapaz, vai passando tudinho! Continuou aquela voz.
Os olhos eram trêmulos. A covardia e a coragem dividindo uma mente desconectada da realidade pelo efeito de substâncias que transformam o homem em um escravo da própria vontade.
Eu tremia. Nada mais que o medo de perder o que veio do suor do rosto dos meus pais. Levou-me o dinheiro do almoço do dia seguinte e o celular cheio de funções que eu ainda nem tinha descoberto, depois saiu correndo. E eu fiquei parado, vendo-o se afastar e me martirizando por não ter usado contra ele a violência que escondo de mim mesmo. Bati nos postes e nos muros. Bati com força no meu próprio rosto. Mas ele já estava longe.
Minutos depois, dentro de um carro de polícia, eu me dei conta de que eu não queria encontrar o que procurava. Desejei que ele estivesse longe dali para que eu não visse de novo aqueles olhos confusos. Os olhos de uma consciência amoral de quem seria punido por nunca ter aprendido o que é certo ou errado. Quando passamos diante de um bar, a televisão ligada me mostrou o horário eleitoral cheio de políticos sem moral. Eles não eram amorais como o homem que me roubou o celular, eram imorais e talvez nunca deixem de ser. Tive nojo deles. Todos eles. Esquerda, direita, verde, vermelho ou amarelo. São todos iguais. Uma professora que tive há muito tempo disse que toda generalização é falsa. Neste caso, espero do fundo do coração encontrar a exceção, pois a regra eu já conheço há muito tempo. O pior de tudo é que no próximo domingo vou colocar meu país diante do governo de alguém que não merece governar. Vou eleger o menos pior por não saber do que o pior é capaz, sabendo que, no fundo, são exatamente iguais. Nenhum deles se importa com a criatura de olhos trêmulos na base de nossa pirâmide social. Nem mesmo eu me importo. No fundo, somos todos imorais ou amorais pelo simples fato de permitirmos que isso continue a existir diante de nossos olhos. Ainda que na parte externa de nossas bolhas

domingo, 12 de setembro de 2010

Algo sobre ser feliz

Pessoas sempre se sentem sozinhas ainda que rodeadas por uma multidão. Às vezes eu me sinto assim. Em outras, no entanto, mesmo estando sozinho, tenho a certeza de que há alguém comigo. Aquela voz que soa no fundo de minha mente e parece ser apenas um pensamento solto, aquela imagem que me faz sentir que o tempo é muito maior do que parece ser e aquela frase que não me cansarei nunca de ouvir:
_Estarei sempre ao seu lado!
Hoje vi de novo as lágrimas no rosto de alguém que gosto muito e me perguntei até quando... Até quando lágrimas e olhos formarão um par nessa dança que chamamos de vida?
A busca pela felicidade é a luta de todos. Mas o que é a felicidade? Um conceito impreciso e abstrato. Abstrato demais... Cada um tem seu conceito. Cada um tem um motivo ou algo que faça com que se sinta feliz. Algumas pessoas acreditam que a felicidade está no carro do ano, em um negócio bem sucedido, em uma viagem ao redor do mundo ou em uma vaga em uma universidade federal. Mas a felicidade, por mais clichê que pareça, está em tudo. De um pólo ao outro, onde haja um ser humano com capacidades fisiológicas para possuir consciência,ou inconciência, pois a felicidade se encontra no interior de cada um de nós.
Todos os dias em meu caminho de casa ao cursinho eu me deparo com as pessoas mais felizes que conheço. Ironicamente não sei se eu seria feliz no lugar dessas pessoas. Eles são um casal de irmãos que nasceram com uma doença. Não sei exatamente qual. Nem conheço profundamente suas histórias, mas sei que não houve um dia sequer que não vi um sorriso naqueles rostos.
Comecei a observar as pessoas ao meu redor e percebi que aquelas que eu mais admiro por suas conquistas, são justamente aquelas menos parecem felizes. Percebi então como são insensatos aqueles que sentem inveja. Seria uma mentira se eu dissesse que nunca senti tal sentimento, visto que ainda ontem invejei amargamente meus viznhos que ouviam música alta enquanto eu tentava estudar. Mas logo eu percebi que, nem se eu quisesse, eu não consegueria ser feliz sendo como eles. Eu sou diferente. Gosto de escalar muros altos. É isso o que torna meus dias especiais... Buscar sonhos distantes.
Uma libélula tem um dia apenas para encontrar um parceiro e perpetuar a existência de sua espécie. Um dia apenas é o que dura sua longa vida. É pouco tempo, mas é tempo demais. Em um dia muitas coisas úteis podem ser feitas. O que faz do seu dia algo especial?

domingo, 22 de agosto de 2010

Meus muros


Escrevo este para, literalmente, contar um sonho. Contando sonhos é o nome do meu blog, porém o único sonho que tenho narrado é meu amor pela medicina. Confesso que essa luta tem preenchido minha vida nos últimos meses, ou anos. Talvez eu tenha perdido parte significativa da minha juventude, mas não é isso que eu quero dizer hoje.
Há algum tempo a tristeza rondava minha vida. Justamente aquela dor que narrei em um dos textos. Às vezes eu chorava escondido, em outras eu tentava me convencer que tudo vai dar certo... Um dia. Esse dia, no entanto me parecia algo tão distante e tão intocável. Era uma dor profunda, mas era também uma dor egoísta. Caro leitor, faço a você um pedido: Nunca se perca nas próprias dores! Nunca se sinta perdido dentro de si mesmo por julgar ser longo e tortuoso demais o seu caminho! Todos os caminhos são longos e todas as dores são profundas. Um caminho, para valer à pena, deve contar com algumas pedras e alguns tropeços.
Na última sexta feira, quando me aproximei do apartamento onde moro, me deparei com uma cena no mínimo nauseante. Um homem, ou um garoto, que aparentava possuir mais ou menos a minha idade revirava meu lixo a procura de algo pra satisfazer as dores do próprio estômago, que gritava. Eu podia ouvir aqueles gritos. Pediam por dignidade. Algo que o fizesse se sentir um ser humano. Tive vergonha. Vergonha de mim mesmo. Dos meus motivos alienados de viver. Da hipocrisia de querer fazer o bem e não ter coragem o suficiente de olhar nos olhos de alguém que é como eu, um ser humano. Será que ele se considera um ser humano? Eu não me considerei naquele momento. Eu era um mauricinho de cidade pequena que reclama da vida perfeita. Sim, perto dele minha vida é o sonho mais bonito que se pode ter. Eu me senti culpado por ter tudo enquanto ele, e muitos outros, não têm nada. A mesma culpa que eu sentia na oitava série quando alguma de minhas professoras me comparava com um de meus colegas exaltando minhas qualidades e diminuindo o outro, que muitas vezes era um de meus amigos. Amigos... Onde estão meus amigos daquele tempo? A vida os levou por caminhos distintos. Caminhos nem sempre tão perfeitos como o meu. Por quê? Quando eu era criança, às vezes eu me perguntava por que eu tinha o vídeo-game mais moderno da época e toda a coleção dos bonecos do Dragon-Ball Z. Eu queria que todos tivessem... Aos dezesseis anos eu li “O manifesto do partido comunista”, de Karl Marx. Em minha pretensão eu achei que tivesse entendido alguma coisa. Saí por aí gritando que o melhor para o mundo era a revolução e que só os socialistas sabiam o que era lutar pelo povo... Bastou que eu estudasse história para perceber que isso não era verdade e, por mais que fosse bela a doutrina de Marx, era uma utopia. A humanidade não está preparada para a igualdade, ainda não está.
Na manhã de sábado perdi muito tempo refazendo minhas antigas perguntas, adormecidas desde que comecei a estudar numa escola para burgueses. Muitas aulas passaram sem que eu conseguisse me concentrar. Quando adormeci depois do almoço eu tive um sonho. Mais que um sonho, foi uma lição.
Um mar de águas mais que cristalinas se perdia diante de meus olhos. Como era bonito... Eu queria mais do que observar. Queria me refrescar naquele mar. Mergulhar naquelas águas e me perder naquele infinito azul e verde. Eu tinha um sorriso em meu rosto e outro em minha alma. Era a mais bela visão, quase inimaginável e indescritível. Meus passos se guiaram na maior velocidade que puderam, mas uma coisa o impediu de continuar. Imensas muralhas surgiram diante de mim. Qualquer um desistiria, mas eu, caro leitor, gosto de escalar muralhas. Um tanto quanto masoquista, eu confesso, mas é bom chegar ao topo. Escalei com força, com garra e, no topo, uma mão sem rosto me ajudou a terminar. Lá de cima eu vi os outros muros que eu precisaria escalar depois daquele... Eram ainda maiores. E, além deles, pessoas brincavam naquela água azul. Quando olhei para seus caminhos, no entanto, não vi nenhum muro. Que injustiça! Por que só eu tenho que escalar tanto? Foi o que pensei, mas aquela mão apontou para algo atrás de mim. Virei-me e observei muros muito maiores do que os meus.De alguns deles eu sequer via o topo. Se aquelas pessoas agora brincavam na água é por que já tinham escalado muito. Foi então, caro amigo, que acordei. Ainda não consegui compreender todas as metáforas, nem tenho a pretensão de compreender completamente. Mas eu sei que tenho muros para escalar. Todos nós temos.
Qual é o meu dever nessa sociedade? Se alguém tiver a resposta, por favor, me ajude a desvendar esse mistério tão insignificante.

sábado, 24 de julho de 2010

Entre pedras e montanhas

Um sonho ainda repousa em minha mente. Um sonho... Não é esse o sentido da vida humana? Buscar sonhos por mais inatingíveis que pareçam. Um astronauta não quer sempre buscar estrelas?
Já cansei de me martirizar por ter errado o que eu sabia naquela maldita prova. Já cansei de tentar não pensar nisso. Mas dessa vez a dor não veio e não precisei do chuveiro para me consolar.
Ocorreu-me que talvez tenha sido o acaso. O que é o acaso? Se eu jogar uma moeda a face voltada para cima será cara ou coroa. Por acaso? Obviamente não, visto que muitas forças invisíveis terão influenciado para que esse fato ocorresse. Forças nunca imaginadas pela mente humana ou facilmente explicadas pela física como a lei da gravidade. Neste, caso mil coisas poderiam influenciar no simples ato de se jogar uma moeda. A distribuição da massa dessa mesma moeda, a força com que ela foi lançada, a distância entre o sol e a terra nesse exato momento... É muito mais fácil acreditar que foi o acaso. O acaso é o conjunto de forças que o ser humano não consegue prever, explicar ou entender.
Foi esse conjunto de forças que eu não entendo, não explico e não posso prever, que aumentaram em mais seis meses a distancia entre eu e o meu sonho. Mas o que são seis meses para quem tem diante de si toda a eternidade?
Para quem tem um caminho logo para seguir é melhor manter a cabeça erguida do que olhar só para o chão. Quero ver as montanhas no horizonte, não apenas as pequenas pedras perto dos meus pés.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

O tempo

Um dia um garoto encontrou um diário no fundo de uma gaveta. Ele pensou duas vezes antes de abrir. Eram os segredos de alguém, que não era ele. Entre a curiosidade e o respeito ele escolheu a curiosidade. Sua surpresa se mostrou nos olhos. Os olhos pequenos de um garoto, que era só um garoto. O que ele encontrou ali foi uma parte de si mesmo e outra parte do que queria ser. Quando as palavras falavam dos sonhos, pareciam ter sido escritas por ele mesmo. Quando falavam de amor, elas o inspiravam a ser como o príncipe com quem sonhava a dona do diário.
Quando aquele garoto cresceu, descobriu que a vida era muito diferente das palavras do diário de alguém que era como ele.
As unhas que fazem carinho na pele. O vapor que sai da boca quando faz frio. O sol que nasce as seis e quarenta e cinco e faz agente fechar os olhos... Onde está tudo isso agora? Longe... Bem longe.
Os cem quilômetros que antes se igualavam ao infinito agora parecem perto demais.
O homem que se fez daquele garoto teve que aprender que não há uma princesa esperando ser salva em nenhuma torre, em nenhum lugar do mundo. Esse príncipe se cansou de sofrer e vai amarrar seu cavalo branco onde ninguém possa encontrar... Ou talvez o liberte.
Não, ele não vai amarrar seu cavalo. Vai transformá-lo em um foguete para que juntos possam tocar a lua. A lua é bem maior que uma princesa qualquer.
E se ele se cansar da lua? Dizem que ela só é bela para quem vê de longe...
Ele não se importa... Só não quer perder tempo com princesas que não querem príncipes... Só não quer ser o brinquedo de uma criança que não sabe como quer brincar... Que não sabe se quer brincar.
Ele sabe que seu cavalo pode ser tudo, menos uma máquina do tempo... Por que o tempo não conhece o caminho de volta.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

O "não"

Ainda me lembro daquele dia. Meu primeiro e significativo “não”. Um garoto mimado e não habituado a esta palavra sente a mais profunda dor quando isso acontece. Um “não” para meus sonhos, um “não” para a forma como eu havia imaginado minha vida por todos os dezoito anos antes daquele dia. Um nome em uma lista pode não significar nada, mas para mim era tudo.
No primeiro momento, tentei pensar em outras coisas e simplesmente fingir que nada estava acontecendo. Sempre odiei ser alvo da piedade alheia. Sempre odiei ver aqueles que amo sofrerem por me ver sofrer.
Guardei minhas lágrimas e derramei-as todas junto com a água que banhava meu corpo. A água quente caindo sobre os ombros e as lágrimas frias escorrendo pelos olhos. É assim que os homens choram, derramando o dor que não se sente na frieza dos sentimentos que não se mostram.
Ainda me sentindo um fracassado fui obrigado a me reunir a outros que também se sentiam assim. Era difícil acordar de manhã. Era difícil não imaginar a repetição daquele dia. Por quanto tempo? Ainda não sei e espero com todas as minhas forças que não se repita mais, mas hoje estou mais preparado. Nem as lágrimas, nem a angústia de não conseguir me atingiriam.
Aquela dor me perseguia e me maltratava, impedia o sorriso que sempre estivera e meu rosto. Contrariei minhas próprias teorias sobre a felicidade. Um dia,no entanto, percebi que ela já não estava ali. Fiz questão não procurar por ela e abri meus olhos para a felicidade que todos temos dentro de nós. Uma derrota é sempre uma vitória quando ampliamos nosso ângulo de visão.
Sim, eu cresci com aquele “não”. Retirei a venda que tapava meus olhos e me impedia de ver o mundo como ele é sem destruir meu mundo. O mundo que criei para fugir deste e que me inspira a criar. Conheci muitas pessoas e fiz grandes amigos. Reconheci meus defeitos e aprendi a superá-los. Aprendi que a distância que nos separa dos nossos sonhos é proporcional ao valor que damos a sua realização.
Não há obstáculo que não se possa transpor, nem dor que não se possa superar.

terça-feira, 15 de junho de 2010

O astronauta




Assim que terminei o blog me deparei com meu primeiro desafio. O que escrever nele? Depois de algum tempo cheguei à conclusão de que o melhor seria me apresentar. Surgiu então o segundo desafio. O que eu diria sobre mim? Seria fácil dizer o que os outros pensam a meu respeito, mas eu nunca quis ser o que pensam que eu sou. Acho que, no fundo, sempre fui o que esperavam que eu fosse sem me perguntar se era assim que eu queria guiar minha vida. Meus sonhos são de fato meus? Sim é a resposta que grita do meu peito. Meus sonhos são uma boa definição de mim, pois dedico todo o meu tempo na luta desesperada por alcançá-los. Que sonhos são esses?
Uma vez ouvi em algum lugar que há dois tipos de homem: o astrônomo e o astronauta. O astrônomo é aquele que observa as estrelas sem nunca deixar o chão. Ele reconhece cada um dos pontos que vê no céu depois que o sol se vai, mas seus pés nunca pisaram outros solos. O astronauta, ao contrário do primeiro, parte para o céu sem saber o que vai encontrar guiando-se apenas por seu instinto de aventura.
Eu quis ser astronauta desde os cinco anos de idade... Antes disso eu queria ser super herói. Não era voar no céu, nem derrotar vilões, nem salvar donzelas indefesas o que eu queria. O que me encantava neles era a forma como ajudavam as pessoas. Um dia, fiquei muito doente. Foi então que conheci um astronauta. Ele se vestia de branco, tinha um sorriso grande e sempre fazia com que eu me sentisse melhor. Passei o meu aniversário no hospital e foi um grande consolo quando ele disse: “Hoje também é o meu dia”.
Eu nasci no dia 18 de outubro... O dia do médico. É isso o que eu quero ser desde os cinco anos.
É triste pensar que nas salas lotadas do cursinho em que estudo, e de todos os outros, um imenso número de pessoas também quer fazer medicina. É mais triste ainda pensar que quase nenhum deles quer ser, de fato, médico. Eles querem ser doutores. Os doutores são os cafetões da dor humana, que a exploram como uma prostituta sem alma e sem sentimentos. É a dor humana que lhes fornece carros, viagens e tudo mais o que o dinheiro puder comprar. Os médicos são aqueles que vêem em uma lágrima um sorriso em potencial e dedicam suas vidas às vidas daqueles que necessitarem de apoio. Não quero ser doutor. Quero ser astronauta.