sábado, 22 de março de 2014

Nem única, nem eterna... Só bonita


 
Muitos meses se passaram e eu ainda acordo com a sensação de estar sonhando. Muita coisa aconteceu...  
Como o astronauta que eu quis ser, fiz minhas malas e parti para o Espaço. Guardei na bagagem minha velha vontade de mudar o mundo, mas deixei lá no fundo um espaço vazio. Eu sabia que a cada passo nessa estrada o pingo de saudade que havia ali se tornaria maior. Hoje, é infinita, mas isso não me entristece... Sei que só se pode ter saudade de algo que, ainda que por um mísero instante, nos fez feliz. Por isso, o tamanho da minha saudade só reflete a quantidade de momentos em que sorri nessa minha vida curta. Sim, guerras de barro, jabuticaba no pé, correr das ondas e o “pium pium”... Abraço apertado de pai, colo de mãe, meu irmão fingindo que morreu, minha irmã dizendo que sou adotado, o chorinho do bebê... Meu nome brilhando naquela tela, não em uma lista... E os irmãos que fiz ao longo do caminho, foram poucos, reconheço, mas são para sempre? E o momento em que eu disse “Eu te conheço de algum lugar?”... Será que eu de fato a conhecia a conhecia? E as derrotas? E os tropeços? E o que o aprendi? Sim... Se há uma coisa que eu não posso negar é que fui e sou feliz, fui e sou amado e é essa a fonte da minha saudade, como é também a fonte da minha felicidade...
Dias como hoje, em que a chuva te prende entre as paredes de um lar desconhecido e se quer regredir à infância sempre vão existir... Se eu fechar os olhos sei que posso ver... É a cozinha da minha velha casa. Meu irmão, na mesa, tem olhos pidões para o fogão e minha irmã meche a calda do bolo de chocolate enquanto minha mãe lava a louça. Ouço a TV ligada. É meu pai que cochila vendo o jogo de futebol... Passo um pouco a roda do tempo, mas ainda é sábado e ainda chove. As luzes do cinema se apagam lentamente, o filme vai começar, mas eu não quero ver o passarinho azul que canta em português, prefiro o reflexo dele nesses olhos verde-azuis... “Avise quando for me olhar!”, “Estou te olhando!”...
 Mas se há uma coisa nessa vida da qual não posso discordar é que tudo o que material é passageiro... Momentos, lugares, pessoas... Há, no entanto, uma forma de torna-las eternas... É guardar tudo isso de forma imaterial lá no fundo de si mesmo, carregado de sentimentos para que nunca se dissipe... Fica na memória e, mesmo que a própria memória deixe de existir, há sempre algo no inconsciente que lhe diz: Eu conheço de algum lugar... É impossível esquecer o que nos fez feliz, mas é burrice querer que tudo volte a ser como era, se a vida lhe mostra outros caminhos. Apego não é saudade. A saudade é a lembrança boa, que revigora e estimula a continuar. O apego não faz bem a alma nenhuma. O que faz bem é a liberdade, o prazer de acrescentar novos vínculos, novas memórias, novas histórias para contar... Guardando sempre os velhos motivos para sorrir e não há motivo mais belo do que a gratidão por estar vivo. Sinto por ter perdido momentos e oportunidades de sugar o melhor dos melhores momentos da minha vida por não saber o quanto, em sua simplicidade, eles seriam eternos... Sinto por não ter prendido entre os dentes o pão de queijo da minha mão para sentir o gosto por mais tempo... Fui guloso e comi de uma vez, porque queria logo que o tempo passasse... Que imaturidade a minha, pois o tempo vai passar de qualquer jeito, apesar ou contra a minha vontade e não há nada que eu possa fazer além de viver os momentos da melhor forma possível... Mas há sempre a chance de começar a agir e reconhecer que não se pode controlar o tempo, que algumas situações são inevitáveis, que nenhum instante acontecerá outra vez e apreciar a vida, não como se fosse única, nem como se fosse eterna, mas com a sabedoria de quem quer levar consigo o melhor de tudo o que houver em seu caminho.