sábado, 20 de setembro de 2014

A Pasárgada

Eu costumava ser mais favorável às esquerdas... Naquele tempo, eu acreditava que a igualdade social plena seria a forma mais eficaz de conter o sofrimento... Depois,com minha própria dor, descobri que nem todo sofrimento é material...  Mas isso é coisa para outra história...
No segundo ano do ensino médio, para um trabalho multidisciplinar, li “ O manifesto do partido comunista” e saí fanaticamente, na exacerbação de meus hormônios juvenis, esbravejando que aquela era a solução, mas fiquei profundamente decepcionado quando descobri o que fizeram da doutrina de Marx. Olhei a política ao meu redor e parei de crer em uma solução. Tornei-me, como os da minha geração, um ser apolítico, apático em relação ao mundo, que faz mais por si que pelo outro ou pelo todo, sem um pensamento ou ideologia definida, que segue a vida por seguir, mesmo não se sentindo bem com a indiferença, e que não sabe em quem votar nas eleições...
Mas, sobre sistemas de governo, eu, na minha humilde e pouco politizada ilusão, penso ainda em um mundo sem governo, sem dinheiro e sem dor, onde a única lei seria a lei do amor. “Ame ao próximo como a ti mesmo”... Ame a ti mesmo... Ame ao próximo...
Nesse mundo imaginário, todos teriam as mesmas oportunidades, mas suas diferenças seriam levadas em consideração. Não se escolheria uma carreira por dinheiro, mas pelas próprias aptidões e todas as funções teriam o mesmo valor, sendo exercidas com o prazer de fazer-se útil ao todo. Não se faria o mal ao outro, a si, nem ao que seria de todos... Cada ser humano seria capaz de reconhecer em tudo o que o cercasse algo digno de seu cuidado, atenção e, principalmente, do tempo, que nunca lhe pertenceu, mas sempre chamou de seu.
Matar? Roubar? O integrante dessa sociedade desconheceria tudo o que é indigno da atenção humana... Ele não se deteria aos pequenos e mundanos desprazeres, não saberia desfazer o bem, não saberia desamar e não conheceria a dor...  
Então, chegaria o dia em que, sabedores de que ainda havia sofrimento em algum lugar do Universo, alguns desses indivíduos sairiam a pregar a sua paz e migrariam para outros cantos... Seriam notáveis e visivelmente diferentes do todo... Sofreriam por isso... Talvez se sentissem impotentes diante de tanta loucura... Tanta dor... Pode ser que ficassem loucos também... Mas, ainda assim, amariam ao próximo... Ainda que o próximo desconhecesse o amor, eles o ensinariam como sorrir nos momentos mais impróprios.
No meio da imperfeição, eles descobririam seus próprios defeitos... Suas fraquezas tão humanas... Talvez se culpassem por elas, até descobrirem que a culpa é um entrave para o amor, pois não ama a si mesmo quem se sente culpado. Também não ama ao próximo, por que só se ama realmente alguém, depois que se aprende a amar a si mesmo. 
Então, conhecendo-se melhor e amando melhor, eles voltariam para casa. Lavariam seus pés, repousariam seus corpos, dormiriam em seus leitos macios e matariam a saudade dos que ficaram. Na manhã seguinte, veriam o nascer do sol e descansariam seus olhos com a visão dos belos jardins. Então, diriam à pessoa amada: É hora de partir novamente, pois ainda há dor. Volto em breve, para um novo repouso.